Descemos à Pena num dia soalheiro de fevereiro e após termos feito parte do percurso do “Morto que matou o Vivo” fomos ao encontro do Alfredo e da Ana, os proprietários da Adega Típica da Pena (Restaurante de gastronomia regional).

Almoçamos vitela grelhada acompanhada com arroz de feijão e conversámos com os dois, aliás três, também esteve presente a filha mais nova do casal, a Mariana.

Falámos sobre a vida, sobre o Restaurante, sobre os animais e sobre a vida no campo. Também nos rimos muito. Ah e aprendemos a fazer presunto!

 

BI

Alfredo Brito, 48 anos, natural da Cova da Beira, Covilhã, Serra da Estrela, marido da Ana Brito e pai da Mariana (a filha mais nova) e da Margarida (a filha mais velha).

Ana Brito, 38 anos, natural da aldeia da Pena, mulher do Alfredo e mãe da Mariana e da Margarida.

 

Como é que vieram para a Pena?

“Já lá vão quase 20 anos. Vínhamos cá passar férias e o Alfredo vinha também e gostou”, diz a Ana. Contam-nos que se conheceram e casaram em Lisboa e depois de algumas vindas à Pena decidiram mudar-se. Estavam cá os avós da Ana e quando se mudaram ainda viveram um ano em casa deles e só depois construíram a sua própria casa e mudaram-se para lá.

Nessa altura a aldeia tinha 7 habitantes. Depois nasceu a Mariana, “ficámos oito, faleceram dois, ficámos seis e tem sido essa a média” conta o Alfredo.

 

Então mas como é que sabiam fazer “as coisas do campo”?

“Nasci com os animais, vivi em Lisboa mas sou do campo. Fomos fazendo tudo aos poucos, com muita força de vontade e principalmente muito trabalho e muita dedicação” diz o Alfredo.

 

Como é o vosso dia a dia?

“A vida do campo é assim… acorda-se de manhã, temos muitos animais para tratar, é a primeira coisa que se faz! Ir para o monte tratar das vacas, dos cordeirinhos, dos porcos, das galinhas, dos vitelos, das ovelhas… temos que tratar disso tudo de manhã”, diz. Isso é a manhã toda? - “Não! Antes das 9h00 já estamos aqui, temos a porta aberta antes das 9h00 e começamos a orientar as coisinhas. Há dias que vem gente, outros que não, há dias quem vem mais, outros que vem menos, mas pronto, nós estamos sempre à espera”.

No final do dia, volta a ser a mesma situação. À noite se tiverem pessoas marcadas para o jantar ficam no Restaurante até mais tarde, caso contrário vão orientar outras coisas. É assim 24 sobre 24.

Os animais ocupam grande parte do dia da Ana e do Alfredo, o cuidar deles, dar-lhes de comer, tirá-los do curral. Contaram-nos que todos eles têm nome mas no que diz respeito aos bois só sai para pastar um de cada vez, não podem estar os dois ao mesmo tempo para evitar confusões. Quando chega a altura de acasalar leva-se o bói às aldeias vizinhas e tem de se aproveitar a altura porque se a vaca não emprenhar perdem-se os subsídios nesse ano.

 

Recordam-se de alguma história interessante que vos tenha acontecido “aqui”?

(Pausa) Aqui está sempre a acontecer!

 

O Restaurante. Quando é que abriu?

Contam-nos que vieram para a Pena já com o fim de abrir um Restaurante, “não havia aqui nada, quer dizer já existia uma adega, do pessoal cá da casa”, esclarece o Alfredo. “Nós fomos restaurando pouco a pouco e, começaram a aparecer pessoas, (não era gente como agora) para visitar a aldeia e era preciso ter alguma coisa onde comer, beber um café” acrescenta a Ana. O Alfredo vinha preparado, sabia fazer um pouco de tudo e trabalhou na área da hotelaria. Contudo foi uma aprendizagem diária grande, a dois.

“No início foi complicado, mas éramos jovens, nada nos metia medo, arriscamos”.

 

Quem foi o vosso primeiro cliente?

(Pausa), (Riso) “Lembro-me que era em escudos”, recorda-se o proprietário da Adega. As pessoas começaram a vir, a conhecer a aldeia, o Restaurante e palavra passou palavra. Naquela altura (há 20 anos) conta-nos que trabalhou bem, que o trabalho fazia-se o via-se o retorno. “Eram tempos diferentes”.

 

Estamos num espaço renovado. Quem vos visitar em 2019 o que poderá encontrar?

A Adega Típica da Pena abriu portas, depois de uma reformulação do espaço com fundos próprios, no início do mês de fevereiro (somos das primeiras clientes desde a reformulação). O espaço, muito cuidado, amplo e com muita luz sofreu modificações no seu interior e exterior. Também a cozinha ficou maior e mais moderna. Os pratos, esses têm se mantido na qualidade e na confecção. “Mantivemos o rústico, alargamos o espaço, temos uma cozinha como deve ser! Ninguém na zona tem uma cozinha tão boa!”, acrescenta o pai da Mariana e da Margarida. “Por mim tinha o meu fogão a lenha”, diz a Ana (mas não é permitido). Os fornos estão fora do Restaurante mas à entrada e o grelhador está no terraço.

 

Sentem/sentiram que a diferença entre a cidade e o meio rural é grande?

Sim.

 

Perguntamos sobre os animais que pastam nos prados… “Os animais que vêem lá fora são para consumo, consegue-se comer o verdadeiro”, diz o Alfredo. Há galos, galinhas, porcos, ovelhas (cuja lã é aproveitada por quem a vem tirar), vacas arouquesas (certificadas pela casa de Cinfães) e bois. É possível ver os animais no percurso pedestre existente na aldeia da Pena. Mata-os cá? “Não… quer dizer, a galinha mato e o porco também, o resto é no local apropriado”, explica.

 

E as abelhas? Quem é que trata das abelhas e quem é que tira o mel?

“Sou eu!”, diz o Alfredo.  O mel é delicioso e está à venda na Adega, tal como o licor de mel. A abordar este tema falou-se um pouco sobre a questão das vespas asiáticas e dos seus ninhos, problema que também tem afetado as colmeias na aldeia da Pena.

 

Então e… o que é que se come aqui?

“Tudo o que se produz aqui a nível de carnes, o cabrito, a vitela e a galinha de cabidela”, sugere o “chef” que a cozinheira é a Ana! Não se esquecem de referir os enchidos, o salpicão, o chouriço, o presunto…  tudo feito no fumeiro pelos dois.

(Neste momento picam-se as últimas fatias de presunto e salpicão que sobraram do almoço na mesa ainda por levantar).

O peixe não se produz aqui mas o Restaurante tem prato de bacalhau, à lagareiro, à casa. Come-se também o presunto, o chouriço e o salpicão. Para sobremesa, o doce da casa ou fruta.

 

Então e... o que é que se bebe aqui?

Bebe-se um bom vinho branco, tinto, maduro. O vinho da “casa” não é da aldeia da Pena mas é da zona, do Douro e do Dão.  Para além deste existe uma grande oferta na garrafeira, vasta e variada, fica a sugestão: Pêra Manca, Barca Velha… Também se bebem os licores, de mel e de castanha, um belo aperitivo para a viagem! Os licores, tal como o mel são feitos pelo casal.

 

O que é que valorizam mais no meio em que vivem comparando com a cidade dado que também já viveram em Lisboa?

“É o contacto com a Natureza, o sossego, eu gosto, não há palavras…”, suspira o Alfredo. “Estamos habituados e a cidade já não nos diz nada”, acrescenta a Ana.

Já há dois anos que não vão à Lisboa e a ida às cidades maiores é pontual, para fazer comprar grandes, levar a filha mais velha (que entrou este ano para a faculdade).

Para além disso, as grandes saídas tornam-se difíceis, têm a porta aberta, pode sempre chegar alguém e também os animais, têm de ser tratados, explicam.